O SINAIT divulga o artigo intitulado Presunção de Impunidade publicado no Jornal Folha de São Paulo com críticas à mudança substancial na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF que determina que para alguém ser preso o processo tem que percorrer todas as instâncias, até chegar ao STF. Em resumo, o réu continua em liberdade mesmo depois de ter recebido, na segunda instância da Justiça, a pena de prisão.
Veja também a repercussão deste polêmico assunto na matéria, abaixo, veiculada pelo O Globo.
Artigo /Folha de S. Paulo - 10/02/2009
Presunção de impunidade
Autor(es): Frederico Vasconcelos
Folha de S. Paulo - 10/02/2009
A SOCIEDADE foi surpreendida por uma mudança substancial na jurisprudência: por sete votos a quatro, o Supremo Tribunal Federal determinou que, para alguém ser preso, o processo tem que percorrer todas as instâncias, até chegar ao STF.
O Supremo tem chamado para si medidas tidas como destinadas a suprir omissões de outros Poderes, como a vergonhosa situação do sistema carcerário. Mas não são os presos por "crimes de bagatela", como furtos de escova de dentes e de chinelos, lembrados pelo ministro Celso de Mello, que entopem os tribunais de recursos. Tem faltado ao Judiciário disposição para conter a avalanche de recursos protelatórios em benefício de réus que podem contratar bons advogados.
O princípio da presunção de inocência está na Constituição desde 1988, mas a grita pelo respeito ao cidadão ganhou eco quando advogados criticaram, no ano passado, os excessos da Polícia Federal.
Vieram, então, a "Súmula das Algemas" e outras m edidas que motivaram resistências da corporação policial, do Ministério Público Federal e de juízes do primeiro grau. O que surpreendeu no julgamento da última quinta-feira foi o alerta de ministros do próprio STF, talvez preocupados com os efeitos do passo dado pela Corte. Joaquim Barbosa advertiu para a criação de um sistema penal de "faz-de-conta", em que o processo jamais chegará ao fim. Foram também votos vencidos os ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia e Ellen Gracie.
Em 2005, a ex-presidente do STF já afirmara que "em país nenhum do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa, aguardando referendo da Corte Suprema". Estudo do MPF, que analisou a execução da pena em Portugal, Espanha, França, Inglaterra, EUA e Alemanha, confirma o que disse a ministra.
Brasília parece ter ficado mais distante do país real. A sociedade aplaudiu quando a Justiça Federal condenou responsáveis pela monumental lavagem de dinheiro no caso Banestado. E quando o inquérito do mensalão resultou em ação penal contra parlamentares da base de apoio do governo Lula.
É preocupante a reação dos juízes desses dois casos. "É um retrocesso. A sensação de impunidade vai aumentar", diz o juiz federal Jorge Gustavo Macedo Costa (mensalão). "Estou me questionando, como juiz criminal, se vale a pena dar impulso a ações penais em relação a crimes de colarinho branco, já que, de antemão, sei que estão fadadas ao fracasso", diz Sergio Fernando Moro (Banestado).
Embora a decisão do STF seja "juridicamente sustentável" (segundo Costa) e "juridicamente razoável" (segundo Moro), a bandidagem de alto calibre -e seus defensores- devem estar exultantes.
Matéria/O Globo - 06/02/2009
STF abre caminho para libertação de presos
Autor(es): Bernardo Mello Franco
O Supremo Tribunal Federal abriu ontem uma brecha para que réus condenados possam continuar em liberdade mesmo depois de terem recebido, na segunda instância da Justiça, a pena de prisão. Por sete votos a quatro, a Corte estabeleceu que a pena só deve começar a ser cumprida quando não houver mais qualquer possibilidade de recurso a tribunais superiores, ou seja, quando o processo estiver julgado pela última instância.
A decisão do STF também permite que todos os brasileiros que estão presos e não foram condenados em última instância possam recorrer à Justiça para ganhar a liberdade, com base no novo entendimento dos ministros.
Fazendeiro beneficiado é acusado de homicídio
No julgamento de ontem, o STF concedeu habeas corpus a um fazendeiro condenado a sete anos e meio de prisão, em segunda instância, por tentativa de homicídio duplamente qualificado. Ele alegou que sua prisão era ilegal até que a sentença fosse confirmada pela mais alta Corte de Justiça do país. O fazendeiro já estava em liberdade desde 2004, graças a uma liminar do ex-ministro do STF Nelson Jobim, hoje ministro da Defesa.
A decisão de ontem altera a jurisprudência do Supremo e deve influenciar os futuros julgamentos do tribunal. O presidente do STF, Gilmar Mendes, disse que a mudança não impede que os réus sejam alvo de mandados de prisão temporária ou preventiva, nas circunstâncias permitidas por lei. Mas deixou claro que, agora, o direito de recorrer em liberdade passa a ser regra, e não exceção.
A decisão alterou uma jurisprudência histórica do STF e provocou discussão em plenário. O embate mais acirrado começou quando o ministro Cezar Peluso citou uma indagação do jurista Cesare Beccaria: "O que ganha a humanidade com a condenação de um inocente?". Irritado, o ministro Joaquim Barbosa disse que a visão favorece a impunidade e permite que bandidos recorram indefinidamente, com o objetivo de adiar o início da pena.
- Estamos criando um sistema penal de faz-de-conta. Se tivermos que aguardar todos os recursos, o processo jamais chegará ao fim - afirmou.
Favorável a deixar os réus recorrerem em liberdade, Peluso reagiu com indignação:
- Se isso fosse verdade, as prisões não estariam superlotadas. Não estaria saindo gente pelas janelas dos cárceres.
Para Lewandowski, lentidão da Justiça não é justificativa.
O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a lentidão do Judiciário não justifica que réus sejam presos sem condenação definitiva. Ele chegou a dizer que os acusados não podem ficar sujeitos ao convívio com facções criminosas e doenças infecto-contagiosas antes que se esgotem todas as chances de recurso.
Além de Barbosa, só três ministros defenderam a chamada execução provisória da pena: Carlos Alberto Direito, Cármen Lúcia e Ellen Gracie.
- Aguardar que a prisão só ocorra após o trânsito em julgado é inconcebível, com todo o respeito. A vencer essa tese, nenhuma prisão seria feita no Brasil - protestou Ellen.
- Temos criminosos confessos que são condenados em primeiro e segundo grau e não vão para a cadeia porque o volume de recursos não se esgota nunca - reforçou Direito.