3-4-2009 – SINAIT
A Proposta de Emenda Constitucional – PEC 12/2006, que altera regras para o pagamento de precatórios (dívidas decorrentes de decisões judiciais), foi aprovada ontem à noite pelo Senado Federal e vai agora para a Câmara dos Deputados. As mudanças aprovadas visam beneficiar a União, estados e municípios que devem muitos milhões, inclusive a servidores públicos.
A aprovação da matéria não foi bem recebida pelo funcionalismo e recebeu contundentes críticas das entidades que representam carreiras do Poder Judiciário, como a OAB, Ajufe, AMB e Anamatra, que divulgaram Nota de Repúdio hoje pela manhã (veja abaixo). Segundo as entidades, a PEC é um calote aos cidadãos e uma afronta ao Judiciário.
O SINAIT também se posiciona contra as medidas aprovadas e manifesta essa opinião desde a apresentação da PEC 12, em janeiro de 2006. “As mudanças aprovadas não resolvem o pagamento das dívidas; pelo contrário, poderá postergá-lo ainda mais. Muitas pessoas esperam há anos pelo pagamento a que já têm direito, vão continuar esperando, e pior, podem até ter perdas nos valores a receber, em razão de parcelamentos ou da instituição do leilão dos precatórios. Dívidas têm que ser pagas; decisões judiciais têm que ser cumpridas”, diz Rosa Jorge. A presidente afirma que o Sindicato vai se juntar a outras entidades para fazer trabalho parlamentar na Câmara e tentar reverter ou modificar o texto.
Veja matérias sobre o assunto, que mereceu inclusive editorial do Correio Braziliense hoje.
1º-4-2009 – Agência Senado
Senado aprova e envia PEC dos Precatórios à Câmara dos Deputados
O Senado aprovou em dois turnos, na noite desta quarta-feira (1º), a Proposta de Emenda à Constituição 12/2006, conhecida como PEC dos Precatórios. Em primeiro turno, a matéria recebeu 54 votos favoráveis e uma abstenção. O senador Marconi Perillo (PSDB-GO), que presidiu a sessão durante todo o processo de votação, convocou três sessões extraordinárias seguidas para que os prazos regimentais pudessem ser cumpridos. No segundo turno, o voto pela abstenção se manteve e 58 senadores votaram "sim". A matéria segue agora para apreciação da Câmara dos Deputados.
A PEC dos Precatórios tramitou durante mais de três anos no Senado. Ela foi apresentada pelo então presidente da Casa, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), inspirada em proposta feita à época pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim, que atualmente é ministro da Defesa. Precatórios são ordens de pagamento originadas a partir de decisões judiciais, sobre as quais não cabem mais recursos, contra a União, estados, Distrito Federal e municípios.
O texto aprovado estabelece que os pagamentos dos precatórios deverão ser feitos exclusivamente na ordem cronológica de sua apresentação. Porém, os débitos de natureza alimentícia (decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez) serão pagos com preferência sobre os demais. Entre os precatórios de natureza alimentícia, a prioridade é para o pagamento cujo titular tiver 60 anos de idade ou mais.
A correção dos valores dos precatórios, independentemente de sua natureza, será feita através do índice oficial de correção e percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios. A PEC também estipula que lei complementar poderá criar um regime especial para pagamento de crédito de precatórios, dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida, incidência de encargos e forma e prazo para liquidação. Enquanto essa lei complementar não é aprovada, estados, Distrito Federal e municípios depositarão anualmente, em conta especial criada para esse objetivo, valor calculado de acordo com suas respectivas receitas correntes líquidas.
Durante a discussão da matéria, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) revelou a situação de alguns municípios paulistas que vivem uma situação de perda de governabilidade em virtude dos precatórios judiciais. Em Serrana, por exemplo, um grupo musical ganhou na Justiça o direito de receber, por um show, R$ 1,5 milhão. "Nem show dos Rolling Stones custa isso", comparou o senador.
Já a senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO) observou que esse é o momento oportuno para o Senado aprovar uma saída para os precatórios judiciais. Ela lembrou que a situação financeira dos estados e municípios é grave e opinou que as modificações no rito de pagamento dos precatórios atrasados permitirão a prefeitos e governadores pagarem o que devem sem se descuidar de suas obrigações com as pessoas que os elegeram.
2-4-2009 – Ordem dos Advogados do Brasil
OAB, AMB, Ajufe e Anamatra: PEC 12 oficializa calote e afronta o Judiciário
Brasília, 02/04/2009 - "A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12 é um atentado ao Estado democrático de Direito. Oficializa o calote e afronta o Poder Judiciário, ao propiciar o descumprimento de suas sentenças." Esse foi o repúdio à aprovação, em dois turnos, da PEC 12, feito hoje (02) pelos presidentes do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto; da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando de Mattos; da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares; e da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Cláudio José Montesso, reunidos na sede da OAB, em Brasília.
Para os dirigentes das quatro entidades, a PEC 12 representa um desrespeito absoluto às decisões judiciais no Brasil, além de ser uma forma clara de interferência do Executivo no Poder Judiciário. "Fazer leilão de sentenças - um dos institutos previstos no texto da PEC e que foi aprovado na noite desta quarta-feira - é a maior ofensa que pode haver às decisões do Judiciário", afirmou o presidente nacional da OAB.
Além da divulgação da nota conjunta, os dirigentes da OAB, Anamatra, Ajufe e AMB já consideram a possibilidade de ajuizar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) junto ao Supremo Tribunal Federal para questionar a sua legalidade, caso a PEC 12 seja aprovada no seu retorno à Câmara dos Deputados.
A seguir a íntegra da nota aprovada pelas quatro entidades:
"A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12, em tramitação no Congresso Nacional, que limita a receita de estados e municípios para pagamento dos precatórios da dívida pública, é um atentado ao Estado democrático de Direito.
Oficializa o calote e afronta o Poder Judiciário, ao propiciar o descumprimento de suas sentenças. Com isso, viola sua soberania, expressa na cláusula pétrea constitucional (artigo 2º), que estabelece a independência dos três Poderes da República.
Quando o Executivo descumpre uma decisão do Judiciário, fragiliza o sistema tripartite, em que se sustenta o regime democrático. Submete o cidadão-contribuinte a uma relação perversa e desigual com o Estado, absolutamente incompatível com o ordenamento jurídico do país. E fere direito humano fundamental, ao pôr em risco a sobrevivência material do credor do Estado.
Pior que os danos materiais a que o submete, possibilitando que seus créditos, judicialmente reconhecidos, sejam pulverizados no curso de muitas décadas, ou que sejam submetidos a leilão, é a transgressão ética que representa.
Dívida é compromisso moral, submetida a prazos que não lesem o credor e que o ressarçam de fato do prejuízo. A PEC 12 viola esses fundamentos, conquistas primárias da civilização. Abala a confiança do cidadão nas instituições do Estado, aumentando a margem de pressão e opressão do Poder Executivo.
Por tudo isso, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) reiteram seu protesto contra a aprovação dessa PEC e apelam aos parlamentares para que a rejeitem e poupem o contribuinte brasileiro de mais esse revés. Caso contrário, irão ingressar com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) junto ao Supremo Tribunal Federal, em defesa do Estado democrático de Direito. Em ambiente de calote, nenhuma democracia se sustenta."
3-4-2009 – Correio Braziliense
Já aprovada pelo Senado, a Proposta de Emenda à Constitucional (PEC) n° 12/2006, que institui regime especial de pagamento de precatórios, se encontra em processo de deliberação final na Câmara dos Deputados. Trata-se de iniciativa correspondente a conceder à União, estados, Distrito Federal e municípios franquias atentatórias a direitos inalienáveis de cidadãos e empresas. Conforme a redação dada ao artigo 95 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), fixam-se em percentuais mínimos os recursos que deverão ser reservados pelo poder público para honrar dívidas reconhecidas pela Justiça.
União e estados só poderão comprometer 3% de suas despesas primárias líquidas do ano anterior no resgate de precatórios. Aos municípios, o percentual será apenas de 1,5%. Como se sabe, precatórios são ordens de pagamento em favor de credores da Fazenda Pública expedidas em sentenças judiciais insuscetíveis de apelação. Ou, no melhor jargão jurídico, transitadas em julgado.
Seguem daí duas ilegalidades que não podem ser transpostas se não mediante grave violência à Constituição. A primeira faz letra morta do princípio da isonomia constitucional que não permite ao Estado dispor de privilégios em detrimento de direitos e garantias essenciais deferidos aos cidadãos e aos empreendedores privados. Quando é o particular que se situa no polo da relação jurídica como devedor do Estado, cabe-lhe cumprir a obrigação. Ou o faz nos prazos e termos pactuados, ou será compelido a fazê-lo por meio de execução judicial, sob pena de ter o patrimônio arrestado para garantir a dívida.
Depois, a PEC 12/2006 articula meio de reduzir os valores estabelecidos pela Justiça mediante constrangimento semelhante à extorsão. Além da limitação draconiana das receitas vinculadas ao resgate dos débitos, a administração pública está autorizada a realizar leilões para quitá-los em 70% dos casos. Só os credores que oferecerem maiores reduções (deságios) sobre o valor fixado nos precatórios serão contemplados em tal espécie de processo licitatório.
O direito das pessoas, físicas ou jurídicas, de receber o que lhes é assegurado pela ordem constitucional vigente no país integra o conjunto de garantias essenciais postas ao largo de alterações por qualquer instrumento legislativo. Não só as mudanças contidas na PEC infringem tais garantias como o Congresso nem sequer poderia cogitar de projetos hábeis a extingui-las ou modificá-las. É o que preceitua o artigo 64, inciso IV, da Constituição: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir (…) os direitos e garantias individuais”.
Não é tudo. A proposta atinge milhões de brasileiros cujas moradias foram desapropriadas ou que sobreviviam com renda oriunda da locação de um imóvel. Legalização de verdadeiro calote do poder público contra credores, é dever da Câmara rejeitar a insólita iniciativa. Caso não o faça, restará a esperança de que o Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez provocado, declare-a afrontosa à Constituição.