O articulista Pedro do Coutto, do jornal Tribuna da Imprensa, publicou hoje artigo em que compara a proposta empresarial de redução de jornada e salários ao desemprego. Para ele, as consequências desta proposta são idênticas ao desemprego, porque retira dos trabalhadores o poder de compra e retrai ainda mais o consumo.
A proposta de redução de jornada de trabalho e salários parte do empresariado como saída para enfrentar a crise. A princípio, algumas centrais sindicais aceitaram conversar sobre essa possibilidade, mas agora a posição é de que esta deve ser a última alternativa.
A redução da jornada de trabalho no Brasil é uma bandeira do movimento sindical, mas sem redução dos salários. Segundo o Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Socioeconômicas - Dieese e o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas - Ipea essa medida, aliada à drástica redução das horas-extras, geraria milhões de postos de trabalho no país.
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21-1-2009 - Tribuna da Imprensa
Artigo - Reduzir salários é o mesmo que desempregar
Pedro do Coutto
Um grupo de empresários peso pesado, tendo à frente Paulo Skaf, Ermírio de Moraes (quem diria?), Fábio Barbosa, presidente da Federação dos Bancos, ex-secretário do Tesouro Nacional, Lawrence Pih, do Moinho Pacífico, e Roger Agneli, presidente da Vale do Rio Doce, propôs aos sindicatos a redução de salários e também da jornada diária de trabalho como forma de evitar mais demissões. Já ocorreram muitas, a começar pela CVRD, uma das maiores empresas do país privatizada pelo governo FHC.
Privatizada sob o ângulo do comendo administrativo e dos lucros obtidos. Não em função do capital inicial formado pelos aportes da Previ, Fundo de Pensão do Banco do Brasil, e do BNDES. Recursos públicos, na escala de 75 por cento, mobilizados para tornar particular uma empresa pública.
Administração sem dúvida eficiente, até a crise detonada pelo subprime, a empresa acumulou lucros extraordinários, tornando-se a segunda mineradora do mundo. Mas, como sempre, ao menor sinal de recessão, passou a produzir não apenas minérios, mas também demissões em série. Privatiza-se os lucros, socializa-se os prejuízos. Demite-se, ainda por cima. O governo deveria ter em mãos uma legislação para casos assim. Não possui.
Entretanto, analisando-se a proposta encabeçada pelo presidente da Fiesp, Paulo Skaf, um dos empresários que mais apoiaram a eleição de Lula, em 2002, e sua reeleição em 2006, na prática, redução de salários e de jornada de trabalho é o mesmo que desemprego. A diferença, apenas psicológica, é mínima. Em ambos os casos, matematicamente, verifica-se queda na remuneração do trabalho. É só fazer as contas. Menor renda dos assalariados, menor consumo, menos impostos.
Temos aí, portanto, uma nítida convergência negativa de efeitos econômicos e sociais. Uma forma, de outro lado, mascarar as estatísticas de desemprego. A diminuição dos vencimentos não influi na escala dos demitidos, porém os reflexos, como estamos percebendo, são os mesmos. A solução proposta nada, absolutamente nada, vai resolver. As raízes da crise são bem mais profundas.
Elas se encontram, caso dos Estados Unidos, na descapitalização, na medida em que reduz o valor dos ativos, como as moradias hipotecadas, por exemplo, e na retração das compras, de parte dos empregados, por temor mais que natural à perspectiva da perda de emprego.
Além disso, a aquisição de bens e produtos está na dependência direta do crédito oferecido. Mas o crédito embute juros, no caso brasileiro ainda por cima a correção monetária.
Dificilmente quem se encontra sob ameaça de desemprego, ou se julga em tal situação limite, poderá se dispor a assumir dívidas. Especialmente a médio e longo prazo. Assumir o crédito é fácil. Pagar é que são elas. Há também o ângulo psicológico.
Como dormir direito e se divertir descontraidamente com as contas vencendo e os salários encolhendo? Somente pessoas não responsáveis, sobretudo em relação as suas famílias, podem agir nesse sentido. As consequências são as piores. Principalmente no Brasil, onde, infelizmente, os juros são os mais altos do planeta. O IBGE apontou uma inflação oficial de 5,9 pontos em 2008.
Muito bem.
Os bancos e o comércio cobraram e cobram 52 por cento ao ano. No mínimo. Porque existem taxas ainda mais altas do que as que oscilam em torno de 4 por cento ao mês. Reduzir salários e jornadas de trabalho significa desemprego contabilmente disfarçado. Nada mais, nada menos do que isso. Uma farsa.