Trabalho Escravo - AFTS resgatam trabalhadores no PA e SC


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
05/02/2009



O site da ONG Repórter Brasil publicou, esta semana, duas matérias sobre resgate de trabalhadores encontrados sob regime de escravidão. De acordo com as reportagens, os fiscais encararam uma longa jornada até chegar às frentes de trabalho. Tiveram que andar a pé, de carro, moto e até de canoa para poder resgatar cerca de 70 trabalhadores que se encontravam isolados, sem receber salários e submetidos à dívidas ilegais, tanto no Pará como em Lebon Régis (SC) .


No Pará, a libertação ocorreu numa propriedade a 190 km de São Félix do Xingu (PA). Os 49 trabalhadores colhiam folhas de jaborandi para abastecer a indústria química paulista. Todos os tipos de violações relacionadas ao crime de trabalho escravo estavam sendo adotadas: isolamento geográfico, endividamento, não-pagamento de salários, alojamentos precários, água sem nenhum tratamento e alimentação inadequada, além de superexploração.


"Esses trabalhadores estavam completamente isolados do mundo", conta Klinger Moreira, AFT que coordenou a operação. O grupo móvel enfrentou muitas dificuldades para chegar até os trabalhadores. Uma das frentes de trabalho ficava a 70 km da sede da fazenda. Os primeiros 20 km do percurso foram feitos de carro e os outros 50 km com uma moto que os fiscais conseguiram emprestada.


A retirada das pessoas do local foi feita de canoa e o retorno à sede da fazenda levou oito horas. "Para se ter uma idéia da distância, um grupo que saiu mais tarde, às 16 horas, teve que pernoitar na margem do rio e só chegou à sede às 13 horas do dia seguinte",  diz o AFT.


Em Lebon Régis (SC), uma mãe deixou o filho trabalhando em uma plantação de tomates para pagar dívidas contraídas por ela. Outros 19 trabalhadores também estavam submetidos às mesmas condições de trabalho escravo na propriedade de plantação de tomate.


Um empréstimo de R$700, contraído pela lavradora, foi utilizado para a compra de uma moto, que logo depois foi trocada por uma geladeira e outros objetos domésticos. "A mãe não quis abrir mão da geladeira e dos objetos. Ela preferiu deixar o filho trabalhando para que a dívida fosse paga", explica Luize Surkamp, Auditora Fiscal do Trabalho que coordenou a ação, iniciada em 19 de janeiro e concluída na quarta-feira 28 de janeiro.


Operações como essas mostram que mesmo com um número reduzido, os AFTs continuam desempenhando seu papel nas mais distantes e diferentes localidades do País. Os esforços da categoria contribuem para o reconhecimento de direitos dos trabalhadores, a exemplo desta situação, em que o Grupo Especial de Fiscalização Móvel notificou o empresário e os trabalhadores, que receberam seus pagamentos na segunda-feira 2 de fevereiro, totalizando R$ 87 mil, referente aos salários atrasados , mais as verbas rescisórias e também uma multa por dano moral individual.  As 49 pessoas libertadas pelos AFTs do Pará - entre elas duas mulheres - foram alojadas em hotéis na cidade de São Félix do Xingu (PA) e aguardam o pagamento das verbas rescisórias.


 


Mais Informações nas matérias abaixo.


 


 


02-02-2009 Repórter Brasil


Fiscais libertam 49 de trabalho escravo na coleta de jaborandi


Depois de encarar uma longa jornada até chegar às frentes de trabalho, grupo móvel encontrou pessoas isoladas, sem receber salários e submetidos à dívida ilegal. Folhas colhidas por elas abasteciam indústria química paulista


Por Bianca Pyl


 


Enquanto Belém recebia cerca de 100 mil pessoas para discutir temas sociais como o trabalho escravo no Fórum Social Mundial, 49 pessoas estavam sendo libertadas pelo grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a mais de 960 km da capital paraense.


A libertação ocorreu numa propriedade a 190 km de São Félix do Xingu (PA). Todos os tipos de violações relacionados ao crime de trabalho escravo estavam sendo aplicados: isolamento geográfico, endividamento, não-pagamento de salários, alojamentos precários, água sem nenhum tratamento e alimentação inadequada, além de superexploração.


"Esses trabalhadores estavam completamente isolados do mundo", conta Klinger Moreira, auditor fiscal que coordenou a operação. O grupo móvel enfrentou muitas dificuldades para chegar até os trabalhadores. Uma das frentes de trabalho ficava a 70 km da sede da fazenda. Os primeiros 20 km do percurso foram feitos de carro e os outros 50 km com uma moto que os fiscais conseguiram emprestada.


A retirada das pessoas do local foi feita de canoa e o retorno à sede da fazenda levou oito horas. "Para se ter uma idéia da distância, um grupo que saiu mais tarde, às 16 horas, teve que pernoitar na margem do rio e só chegou a sede às 13 horas do dia seguinte", ilustra o auditor fiscal.


Havia outra frente de trabalho mais próxima, a 40 km da sede da fazenda, mas a dificuldade para semelhante: só os 20 km iniciais foram percorridos de carro. Fiscais chegaram a caminhar 7 km no barro para alcançar o local em que os empregados estavam. "Eles eram obrigados a caminhar até 15 km pela floresta para colher as folhas de Jaborandi e voltavam esse mesmo percurso carregando sacos de até 60 kg da folha", relata Klinger.


Os trabalhadores foram aliciados no Maranhão, em maio de 2008, por Maria Georgeres Daher. Segundo apuração dos fiscais, ela recebia recursos da empresa química Sourcetech, com base em Pindamonhangaba (SP), para a fabricação da pilocarpina, um alcalóide extraído das folhas do jaborandi (Pilocarpus microphyllus). A planta brasileira é utilizada pela indústria química principalmente na fabricação de colírio para glaucoma e cosméticos.


A Sourcetch tem, desde maio de 1997, o registro Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos, que permite a comercialização de seus produtos no país. A empresa também obteve um certificado da Comissão Européia, desde março de 1998, o Certification of Suitability of Monographs of the European Pharmacopoeia pela European Department for the Quality of Medicines.


De acordo com Klinger, a intermediária da mão-de-obra utilizava a conta de uma empregada para receber os recursos da empresa. Os recibos dos depósitos estão na mão dos fiscais. "A prova que temos são os depósitos efetuados, Maria não manteria o negócio se não fosse por esses pagamentos".


A fiscalização apurou que a aliciadora entrou em contato com a empresa para oferecer as folhas colhidas e fechou um acordo. Os fiscais encontraram também alguns vídeos feitos por Maria que mostram os funcionários durante o trabalho. Há, ainda, um vídeo que registra um representante da Sourcetech, a quem Maria chama de "patrão".


Por conta do isolamento, os produtos necessários para o trabalho quanto e para uso pessoal eram comprados pela contratante, que revendia tudo pelo dobro do preço. "Eles recebiam pequenos adiantamentos sem nenhuma periodicidade, algumas pessoas ficaram até dois meses sem receber nada", descreve o coordenador da ação. Os funcionários ainda eram obrigados a comprar um kit contendo repelente e remédio para picada de cobra.


Um dos acampamentos era chamado pelos trabalhadores de "inferno verde" e ficava próximo a um rio. Todos os abrigos eram barracões de lona, com piso de chão bruto, sem colchões ou camas. Não havia água potável no local, nem instalações sanitárias.


O auditor fiscal entrou em contato com a Sourcetech e conversou com um diretor técnico que reconheceu a compra da produção dos trabalhadores libertados. "Ele disse que a empresa não iria pagar os direitos trabalhistas. O que poderiam fazer era comprar as 10 toneladas de Jaborandi colhidas para que o dinheiro pudesse ser repassado aos trabalhadores. O valor das 10 toneladas não chegaria a R$ 50 mil", relata Klinger.


Após o resgate, as 49 pessoas libertadas - entre elas duas mulheres - foram alojadas em hotéis na cidade de São Félix do Xingu (PA) e ainda aguardam o pagamento das verbas rescisórias.


A Repórter Brasil entrou em contato para registrar a posição da empresa, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.


 


 


Repórter Brasil 04/02/2009


Escravidão de jovem "compensa" dívida contraída pela mãe


Sem condições de pagar "empréstimo" ao gerente de fazenda, mãe deixa filho adolescente trabalhando "de graça" na plantação de tomate. Junto com ele, outras 19 pessoas eram exploradas em condições análogas à escravidão


Por Bianca Pyl


Para saldar uma "dívida" com o gerente da fazenda onde plantava tomates em Santa Catarina, uma mãe largou o filho de apenas 16 anos trabalhando em condições análogas à escravidão como forma "pagamento" aos patrões. Depois de passar cinco meses recebendo somente "vales" (no valor de R$ 50 a cada mil pés de tomates plantados) para fazer compras num mercado indicado pelos empregadores e pegar R$ 700 emprestado, a mãe do adolescente resolveu deixar a lavoura no início de 2009.


Por ter deixado o trabalho sem concluir o plantio de tomates para a próxima safra, ela saiu da propriedade em Lebon Régis (SC) sem receber nada. O próprio filho dela, então, permaneceu na labuta como forma de pagar a quantia devida. O empréstimo (R$ 700) contraído pela lavradora foi utilizado para a compra de uma moto, que logo depois foi trocada por uma geladeira e outros objetos domésticos. "A mãe não quis abrir mão da geladeira e dos objetos. Ela preferiu deixar o filho trabalhando para que a dívida fosse paga", explica Luize Surkamp, auditora fiscal do trabalho que coordenou a ação, iniciada em 19 de janeiro e concluída na quarta-feira passada (28).


Em entrevista à Repórter Brasil, o adolescente, que nunca freqüentou a escola, disse que a dívida era dele. Os fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) constataram, porém, que a dívida era mesmo da mãe. O jovem pretendia pegar o dinheiro do seguro-desemprego no final da safra (sem nenhum tipo de salário até lá), previsto para abril, e voltar a morar com pai, que é caseiro numa fazenda no município de Costa Matos (SC).


Outros 19 trabalhadores estavam submetidos às mesmas condições de trabalho escravo na propriedade de plantação de tomate. Inicialmente, o produtor Osnir Linz se apresentou como empregador, pois era ele quem havia assinado a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) dos funcionários.


Contudo, a equipe fiscal iniciou uma investigação para chegar ao real empregador. Por meio de notas fiscais, ficou comprovado que Osvaldo Batista, um dos sócios da Iguape Comércio de Legumes LTDA, que mantém um estabelecimento na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), havia financiado toda lavoura de tomate e era o real empregador. "Encontramos notas de compras das sementes, dos adubos e de óleo para os tratores, entre outras coisas, em nome de Osvaldo", conta Guilherme Kirtschig, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) do ofício de Joaçaba (SC), que integrou o grupo móvel.


Osvaldo Batista se deslocou até Santa Catarina no dia 23 e assumiu os vínculos empregatícios. Segundo Guilherme, o comerciante disse que não tinha conhecimento da situação dos trabalhadores e só aceitou financiar a lavoura porque Osnir não tinha condições para iniciar a plantação. O empresário assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), no qual se compromete a pagar os salários atrasados dos trabalhadores, mais as verbas rescisórias e também uma multa por dano moral individual. Os pagamentos foram feitos na segunda-feira passada (26) e totalizaram R$ 87 mil.


O comerciante também está analisando um outro TAC no qual há o compromisso de não desrespeitar a legislação trabalhista e também não comprar de fornecedores que utilizem mão-de-obra escrava. "Ele levou a proposta para analisar, mas tudo indica que irá assinar", detalha o procurador.


 


Irregularidades


Alguns funcionários chegaram na fazenda em setembro de 2008, os últimos começaram a trabalhar no início de janeiro, com a promessa de receber um bom pagamento no final da safra de tomate, que seria toda vendida para a empresa Iguape Comércio de Legumes.


Essa promessa provavelmente não seria cumprida, já que Osnir iria somar quantas caixas de tomates foram produzidas por cada funcionário, subtrair quantos vales foram pagos e também o valor que gastou para fazer o registro na CTPS. "Os gastos com contador, INSS [Instituto Nacional de Seguro Social] , entre outros, seriam pagos pelos próprios funcionários. Quer dizer, no final das contas, não iriam receber quase nada", indigna-se Luize.


Quando entregava os "vales", Osnir ainda cobrava a assinatura de recibos como se os trabalhadores estivessem recebendo salários normalmente.


As casas que abrigavam as pessoas eram de madeira, com telhas de barro e muitas frestas. Um esgoto corria a céu aberto no local. Não havia água potável: as famílias bebiam água do córrego e de um poço próximo ao local.


Além disso, os funcionários manejavam agrotóxicos sem equipamentos de proteção individual (EPIs), as áreas não eram sinalizadas quanto à utilização dos produtos e as embalagens ficavam espalhadas por toda lavoura. Segundo o grupo móvel, a situação oferecia risco à saúde e segurança dos trabalhadores e, ao todo, 40 autos de infração foram lavrados.


A Repórter Brasil tentou entrar em contato com Osvaldo Batista, que assumiu a responsabilidade sobre o caso, mas não obteve retorno.

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