Situação de imigrantes que trabalham no País demanda ainda maior atenção do poder público em razão da pandemia de Covid-19
Ação fiscal de combate ao tráfico de pessoas e trabalho escravo resultou no resgate de 10 trabalhadores peruanos, um deles de 17 anos, de uma oficina de costura em São Paulo. A ação foi coordenada por Auditores-Fiscais do Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho de São Paulo – SRT/SP, com apoio do Grupo Especial de Fiscalização Móvel – GEFM da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho – SIT, do Ministério da Economia.
A maioria dos resgatados havia acabado de chegar ao Brasil. Muitos deles estavam indocumentados e vieram a São Paulo para trabalhar na oficina de costura. Ali, foram submetidos a jornada exaustiva, condições degradantes, restrição da liberdade de ir e vir, servidão por dívida, e ainda enganados em relação às condições de trabalho oferecidas pelo aliciador.
As roupas que estavam sendo costuradas no local eram de marcas famosas, mas aparentemente falsificadas, para serem vendidas no comércio informal. A oficina foi interditada pelos Auditores-Fiscais do Trabalho e a Polícia Federal instaurou inquérito policial para apuração dos fatos.
Os trabalhadores resgatados foram levados para abrigos da rede de assistência social do município de São Paulo e inseridos no Cadastro de Pessoa Física e no Seguro-Desemprego Especial. Também receberam as orientações para o ressarcimento dos seus direitos, visto que o empregador não regularizou a situação laboral deles, mesmo devidamente notificado pela Fiscalização do Trabalho.
A operação contou com a colaboração da Polícia Federal, da Defensoria Pública da União, da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e do Consulado do Peru.
Celeridade na documentação é essencial
O Sistema Federal de Inspeção do Trabalho foca seus esforços na proteção das vítimas, na promoção de seus direitos fundamentais e na responsabilização administrativa dos perpetradores desse ilícito. Busca, assim, promover a rápida documentação dos trabalhadores e seu acesso imediato ao Seguro-Desemprego e a todas as verbas de natureza trabalhista anteriormente sonegadas.
A operação teve início em 4 de março e ainda está em curso. Apesar da urgência que a Auditoria imprimiu ao caso, para que os trabalhadores começassem a receber logo o Seguro-Desemprego, principalmente por causa da pandemia do novo coronavírus, surgiram dificuldades na emissão de documentação oficial dos imigrantes. Nessa operação, nove dos 10 resgatados eram indocumentados.
De acordo com a Auditora-Fiscal do Trabalho Lívia Ferreira, que integrou a ação, um dos obstáculos enfrentados é que a Carteira de Trabalho perdeu a validade como documento de identificação civil. “E isso em um momento que o número de indocumentados tem aumentado, o que indica que também cresce a precarização do trabalho”, comenta a Auditora.
Lívia detalha que a Carteira de Trabalho era o instrumento que vinha sendo adotado pela Inspeção do Trabalho para documentar o imigrante de forma célere e emergencial e que esse resgate foi a primeira operação depois da perda de status da Carteira de Trabalho. “Sem o documento do trabalhador, há enorme dificuldade para efetivar as medidas do resgate. Ainda há trabalhador sem receber o Seguro-Desemprego por não ter documento de identificação para sacar a parcela no banco, apesar de estar liberada.”
Imigrantes sem proteção
A situação precária dos imigrantes no mercado de trabalho brasileiro se agrava em razão da pandemia de Covid-19. Nessa semana, dois trabalhadores bolivianos que atuavam em oficinas de costura morreram vitimados pela doença, em Guarulhos (SP) e em São Paulo (SP).
De acordo com o coordenador do Centro de Apoio e Pastoral do Migrante – Cami, Roque Pattussi, em entrevista ao Blog do Leonardo Sakamoto, além do ambiente insalubre – superlotado, sem ventilação e higiene –, os imigrantes enfrentam a falta de acesso às informações sobre a pandemia. “Nas oficinas de costura mais pobres, não há rádio ou televisão ligados para passar o mínimo de instrução sobre a doença. Eles acabam perdendo a vida por falta de informação adequada. Não sabem identificar os sintomas, quando devem ir a uma Unidade Básica de Saúde ou a um pronto-socorro de hospital”, lamenta.
Leonardo Sakamoto informa ainda que, diante da situação, há dois temores para as organizações da sociedade civil que atuam junto a esse público. Primeiro que a infecção se prolifere. Depois, que as pessoas não tenham recursos para se sustentar durante a crise por serem estrangeiros sem documentos de permanência.
“Com as oficinas de costura paradas, por conta da quarentena imposta pelo governo estadual, reduz-se a velocidade de contágio pelo coronavírus. Mas os trabalhadores informais ficam em uma situação econômica difícil porque não sabem se poderão acessar à renda básica emergencial. Entidades da sociedade civil solicitaram ao governo federal um posicionamento quanto ao pagamento do benefício a trabalhadores sem CPF ou documentos de autorização de residência e de trabalho no país”, informa.