Por Solange Nunes, com informações da SRT/MG
Edição: Nilza Murari
Auditores-Fiscais do Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Análogo ao de Escravo da Superintendência Regional do Trabalho de Minas Gerais – SRT/MG resgataram, no dia 14 de julho, dez trabalhadores – dentre eles, quatro mulheres e um adolescente – em condições análogas às de escravos numa propriedade rural na colheita de café no município de Ibiraci, interior de Minas Gerais. Participaram da operação representantes do Ministério Público do Trabalho e agentes da Política Rodoviária Federal.
De acordo com a equipe de Auditores-Fiscais, os dez trabalhadores estavam em situação degradante de trabalho e moravam em alojamentos sem as mínimas condições de habitabilidade. A estrutura do alojamento era precária e compartilhada entre os trabalhadores, inclusive casais.
As instalações elétricas eram improvisadas, havendo risco de choque elétrico. Não havia coleta de lixo nem pessoa responsável pela limpeza do local, razão pela qual havia muito lixo nas proximidades do imóvel. Também não havia rede de esgoto para as águas do banho, lavabo, cozinha e área de serviço. A água vazava e fica empoçada em torno da casa.
A água utilizada era acondicionada em uma caixa d’água sem tampa, sem tratamento ou processo de filtragem antes de ser consumida pelos trabalhadores. Para reduzir a sujeira da água, os trabalhadores fixaram pedaços de pano nas torneiras para reter partículas sólidas diversas.
No alojamento, Auditores-Fiscais constataram que não havia camas para todos os trabalhadores. Alguns deles dormiam em colchões dispostos diretamente no chão. As roupas de cama e cobertores utilizados pelos trabalhadores estavam bastante deteriorados e foram trazidos pelos próprios trabalhadores. Não havia armários ou guarda-roupas para guardarem seus pertences e roupas, que ficavam em cima das camas, pelo chão ou dependurados nas paredes dos quartos.
Os locais para preparo de refeição eram mantidos sem a menor condição de higiene. Não havia armários para guardar os mantimentos, que ficavam espalhados pela casa. Um dos casais que habitava o alojamento preparava as refeições em um fogareiro no quarto, com risco de provocar um incêndio, ou de serem intoxicados em eventual vazamento de gás enquanto dormiam.
Mais irregularidades
Com relação às condições de trabalho, os Auditores-Fiscais verificaram que o patrão não garantia aos empregados qualquer direito. Não havia registro na Carteira de Trabalho, configurando grave irregularidade do empregador, com sérias repercussões para os trabalhadores, como a falta de proteção social em um acidente de trabalho, por exemplo.
Os empregados tinham que adquirir os Equipamentos de Proteção Individual – EPIs. Não havia banheiros na frente de trabalho, e os trabalhadores satisfaziam suas necessidades fisiológicas escondidos entre os pés de café. Essa era uma situação constrangedora, especialmente para as quatro mulheres que faziam parte do grupo. Nesta situação, os empregados ficavam expostos ao risco de contato com animais peçonhentos e não tinham a higienização adequada. Os trabalhadores relataram ter encontrado uma cobra cascavel próximo ao local de refeição, evidenciando os riscos de acidentes com animais peçonhentos na atividade.
Na frente de trabalho, não havia local para os trabalhadores aquecerem e realizarem suas refeições. Os trabalhadores cozinhavam as próprias refeições, em geral no dia anterior, acondicionavam em marmitas e comiam a comida fria. Para comer, improvisavam algum local menos exposto ao sol ou a outras intempéries. Comiam sentados no chão ou em algum objeto que pudesse ser utilizado como assento.
Os Auditores-Fiscais apuraram, ainda, que não havia lavatório para higienização das mãos nas frentes de trabalho, situação especialmente preocupante em tempos de pandemia do coronavírus.
Perigo de contaminação
A equipe de fiscalização apurou que o fornecimento de água potável não era garantido pelo empregador. Cada um deles tinha que providenciar sua própria água e recipiente para armazená-la. Se a água acabasse, não havia como repor.
No que se refere às medidas de prevenção ao contágio do novo coronavirus, o empregador negligenciou os riscos de contaminação nos diversos ambientes de trabalho, em especial os alojamentos e transporte de trabalhadores. Nenhuma medida de prevenção foi adotada.
Os trabalhadores não foram instruídos sobre as medidas de proteção necessárias à redução do risco de contaminação pela Covid-19, sobre distanciamento social, proibição de compartilhamento de itens pessoais, etiqueta respiratória, uso de máscaras, condutas de higiene pessoal e limpeza dos ambientes de trabalho, dentre outras recomendações.
De acordo com os Auditores-Fiscais do Trabalho, o conjunto de irregularidades demonstra que o empregador rural não atendeu às exigências de segurança e saúde previstas na legislação, patrocinando o desenvolvimento de trabalho que desconsidera aspectos básicos de segurança e saúde e, mais que isso, da dignidade do ser humano, fato que degrada o trabalho e avilta a dignidade humana.
Verbas rescisórias
Ao constatar as irregularidades, a equipe de fiscalização interrompeu imediatamente as atividades laborais e determinou que o empregador retirasse os trabalhadores migrantes da cidade de Caetanos, interior da Bahia, do alojamento e os encaminhasse a um hotel ou pensão. A equipe calculou em cerca de R$ 45.000,00 o valor das verbas salariais e rescisórias devidas aos trabalhadores. Os dez trabalhadores receberam as verbas devidas no dia 15 de julho e retornaram à cidade de origem no dia seguinte.
Os resgatados ainda receberam guias de Seguro-Desemprego para o Trabalhador Resgatado, fazendo jus a três parcelas do benefício. Cópia do relatório circunstanciado da inspeção será encaminhada ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério Público Federal para as providências cabíveis no âmbito de suas competências.