A liminar proíbe duas construtoras de cometerem novamente as irregularidades e a obrigação de fazer o pagamento das verbas rescisórias, além da reparação ao final dos danos individuais e coletivos aos trabalhadores e menores. Este é o primeiro resgate de trabalhadores em condição análoga à de escravo em Sergipe
Por Lourdes Marinho, com informações do MPT/SE
A Justiça do Trabalho em Nossa Senhora da Glória (SE) concedeu liminar e determinou às construtoras COINPE e CVM obrigações de fazer e não fazer e de pagar por explorarem trabalho análogo ao escravo e mão de obra infantil.
A decisão é resultado de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Defensoria Pública da União (DPU) após o flagrante de 2 homens em trabalho escravo e 3 adolescentes em trabalho infantil numa pedreira em Canindé do São Francisco em maio deste ano, durante operação feita pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), coordenado por Auditores-Fiscais do Trabalho da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Previdência. Além dos Auditores-Fiscais do Trabalho, participaram da inspeção, que resultou no primeiro resgate de trabalhadores em condição análoga à de escravo em Sergipe, servidores do MPT, da DPU e da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Na ação, o MPT e DPU pleitearam liminar para a proibição dos empregadores de cometerem novamente as irregularidades e a obrigação de fazer o pagamento das verbas rescisórias, além da reparação ao final dos danos individuais e coletivos.
A Justiça do Trabalho concedeu a tutela de urgência. Com a decisão, as empresas estão proibidas de submeter trabalhadores à condição análoga à de escravo e contratar menores de 18 anos, salvo na condição de aprendiz e apenas nas atividades permitidas (em pedreiras não é permitido o trabalho de crianças e adolescentes e é uma das piores formas de trabalho infantil); devem registrar os empregados e assinar a CPTS; depositar mensalmente o percentual do FGTS; capacitar os trabalhadores; fornecer água potável e alojamentos; fornecer EPIs; respeitar a jornada de trabalho, dentre outros.
Para a juíza do Trabalho Marta Cristina dos Santos, os relatórios apresentados nos autos do processo demonstram que há uma relação de trabalho entre os trabalhadores identificados em situação análoga a de escravo e infantil as demandadas. “O relatório de fiscalização anexado ao feito não deixa dúvida de que os fatos narrados na inicial existiam no momento das diligências e, infelizmente, são reveladores de um mal que o Brasil ainda não conseguiu se livrar: o trabalho infantil e o análogo à escravidão”, analisa a juíza.
De acordo com a decisão, as provas colhidas e anexadas no processo juntamente com os depoimentos colhidos dos trabalhadores, que constam no relatório dos Auditores- Fiscais do Trabalho, demonstram a absoluta precariedade das condições de trabalho disponibilizadas pelos empregadores. “Mais que isto: não se garantia direitos básicos, mínimos, aos trabalhadores, com absoluto desrespeito à Carta Magna, que, dentre outros princípios exige que se respeite a dignidade de trabalhadores”, ressalta, a juíza do trabalho na decisão.
Caso descumpram as obrigações, as construtoras poderão pagar multa de R$ 10 mil em relação àquelas que envolvam trabalhadores de forma individual, sendo tal valor devido por cada infração relacionada a cada trabalhador. Quanto às demais obrigações de fazer, foi fixado o valor de R$ 50 mil se houver descumprimento.
Relembre o caso
Em maio deste ano, durante as inspeções do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, a equipe encontrou, ao todo, 34 trabalhadores extraindo fragmentos de rochas no município de Canindé do São Francisco e realizando o corte de pedras paralelepípedo, com o auxílio de ferramentas manuais e rudimentares. Todos estavam sem o devido registro do contrato de trabalho, recebiam por produção, não tinham garantidos os direitos trabalhistas, como a carteira de trabalho assinada e pagamento de 13º salário e FGTS; não tinham acesso a instalações sanitárias, água potável, lugar para acondicionar os alimentos, faziam refeição no mato, não haviam sido submetidos a exame médico admissional, nem a treinamento e não recebiam equipamento de proteção individual.
Dentre esses trabalhadores, dois foram flagrados em condição análoga à de escravo, que foram resgatados, e três adolescentes em trabalho proibido, sendo afastados do trabalho por estarem em atividade em locais e serviços insalubres ou perigosos, conforme regulamento e Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Decreto n° 6.481/2008). Um deles começou a trabalhar aos 13 anos em uma das pedreiras.