Em audiência pública, a representante do SINAIT falou sobre o arcabouço legal que ampara a atuação da Inspeção do Trabalho na fiscalização dos direitos dos trabalhadores terceirizados
Por Dâmares Vaz
Edição: Andrea Bochi
A terceirização, mesmo irrestrita, deve respeitar a dignidade humana do trabalhador e não pode servir à venda de mão de obra e nem ao barateamento de custos das empresas por meio do dumping social, é o que afirmou a Auditora-Fiscal do Trabalho Beatriz Cardoso Montanhana, em audiência pública nesta terça-feira, 11 de abril, na Comissão de Trabalho (CTrab) da Câmara dos Deputados. A Auditora representou o SINAIT no debate que tratou de terceirização e reforma trabalhista, e falou sobre o arcabouço legal que ampara a atuação da Inspeção do Trabalho na fiscalização dos direitos dos trabalhadores terceirizados.
Acompanharam a discussão também o presidente do Sindicato, Bob Machado, a diretora Maria Teresa Pacheco Jensen e o delegado sindical Alex Myller (PI). O debate foi realizado por requerimento do deputado Bohn Gass (PT/RS), que conduziu a audiência.
“A Constituição Federal, em seu artigo 170, garante a livre iniciativa, mas também a valorização do trabalho humano, existência digna e justiça social. Esses valores têm que prevalecer nas relações de trabalho terceirizadas”, destacou Beatriz Montanhana. Além disso, ela ressaltou os parâmetros definidos pela Lei 6.019/1974, alterada pela Lei 13.467/2017 (a reforma trabalhista), que devem ser usados para proteção do trabalhador e verificação da regularidade das relações trabalhistas terceirizadas.
“As empresas contratadas devem ter capacidade econômica, que significa capital mínimo e solvência, para garantir créditos para o pagamento de direitos trabalhistas. Também é responsabilidade desses empregadores a devida gestão da mão de obra. É necessário lembrar ainda que a Lei 6.019 define que a contratante tem responsabilidade solidária em relação ao cumprimento das normas de proteção e saúde do trabalhador. Assim, a contratante tem o dever de vigilância e diligência para verificar se essas normas são respeitadas pela empresa contratada para prestar o serviço”, detalhou.
Para a Auditora, é preciso ampliar o alcance desse dever de vigilância e diligência das contratantes para a verificação do cumprimento também das obrigações trabalhistas. “Hoje, essa responsabilidade é subsidiária, o que joga sobre o trabalhador o ônus da comprovação de que seus direitos não foram respeitados”, pontuou.
Ela chamou atenção ainda para a necessidade de fiscalização e responsabilização ao longo de toda a cadeia de abastecimento. “É muito difícil apurar a responsabilidade dos atores do topo das cadeias de abastecimento, que se beneficiam da mão de obra utilizada nas bases. Mas as grandes empresas têm condições de garantir a dignidade do trabalhador em todas as etapas das cadeias produtivas.”
Terceirização e trabalho escravo
Representantes do Ministério do Trabalho no debate, Auditores-Fiscais do Trabalho ressaltaram a relação entre a terceirização e o trabalho análogo ao escravo.
Para o coordenador-Geral de Fiscalização, Auditor Luiz Henrique Lopes, a terceirização não pode ser enxergada pelas empresas como um cheque em branco. “Mas, infelizmente, a terceirização deixou trabalhadores desprotegidos em várias situações encontradas pela fiscalização. Os grandes resgates que fizemos em 2023 estão atrelados à terceirização, como nos casos das vinícolas e arrozais no Rio Grande do Sul, do corte da cana-de-açúcar em Goiás, e do festival Lollapalozza em São Paulo.”
Ele destacou ainda que, para combater a precarização das relações trabalhistas e o trabalho escravo, é necessário que a fiscalização do trabalho tenha mais Auditores-Fiscais do Trabalho. “Nosso dever é estar em campo para garantir que a lei seja aplicada, e que o trabalhador tenha dignidade. Mas a carreira precisa de mais servidores.”
A partir do relato de casos, o Auditor Marco Antônio Costa acrescentou que, na maioria das vezes, trabalhadores terceirizados não têm sequer os direitos constitucionais respeitados.