Artigo - Trabalho escravo no Brasil: desafios e avanços na luta pela erradicação


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
14/07/2023



O artigo “Trabalho escravo no Brasil: desafios e avanços na luta pela erradicação” dos advogados Priscilla Carbone e Renan Duarte foi publicado no Blog do Fausto Macedo, do Jornal Estado de São Paulo, nesta sexta-feira, 14 de julho. Confira na íntegra.


(*) Por Priscilla Carbone e Renan Duarte


O Brasil, uma nação reconhecida por sua diversidade cultural e riqueza natural, ainda enfrenta uma dura realidade: o trabalho escravo. Apesar dos avanços sociais e econômicos alcançados nas últimas décadas, essa prática desumana persiste em diferentes regiões do país. Segundo dados disponibilizados pelo Governo Federal, 926 pessoas foram libertadas apenas nos três primeiros meses de 2023, uma média de 11 trabalhadores por dia.


O Brasil possui uma história marcada pela exploração do trabalho humano, desde os tempos coloniais até os dias atuais. A escravidão foi oficialmente abolida em 1888, mas suas sequelas persistem na forma de trabalho análogo à escravidão. Milhares de pessoas são submetidas a condições degradantes, jornadas exaustivas e violações de direitos básicos em diversas regiões do país.


O trabalho escravo moderno envolve a exploração de seres humanos em condições degradantes, privando-os de sua liberdade e dignidade. Geralmente, as vítimas são indivíduos em situação de vulnerabilidade social, como migrantes, trabalhadores rurais, indígenas e pessoas em situação de pobreza extrema. São submetidos a jornadas exaustivas, alojamentos precários, falta de acesso a água potável e condições de higiene inadequadas.


Vários projetos de lei foram propostos no âmbito legislativo, visando fortalecer a legislação e as medidas de combate ao trabalho escravo. Todavia, esse "bloco" de propostas não avançam em suas tramitações. Proposto em 2005, o PL 5.016/2005 originou o referido bloco, aglutinando propostas posteriores sobre o mesmo tema e, desde então, acumulou 41 projetos - 13 apenas neste ano.


A maioria dos projetos propostos tem a finalidade de aumentar as penalidades impostas, como a cassação do CNPJ de companhias flagradas, ou até mesmo a expropriação de propriedades urbanas e rurais. Sob o ponto de vista criminal, busca-se classificar o crime em hediondo. Por outro lado, alguns projetos tentam dissociar o trabalho escravo de condições degradantes de trabalho - expressões equivalentes atualmente.


Quanto às punições, merece destaque que o artigo 243 da Constituição já prevê a expropriação de propriedades, mas seu texto diz que tal expropriação ocorrerá "nos termos da lei", dependendo de um texto legal que se arrasta há quase duas décadas. Enquanto isso, pessoas e empresas flagradas continuam se escondendo atrás da suposta falta de previsão legal.


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Apesar da importância desses projetos de lei, sua aprovação é apenas o primeiro passo na luta contra o trabalho escravo: a mera existência de leis mais rígidas não é suficiente para erradicar o trabalho escravo. A fiscalização efetiva é o ponto crucial para garantir o cumprimento das normas e identificar casos de exploração. O Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Inspeção do Trabalho têm desempenhado um papel fundamental nesse processo, realizando operações de resgate e investigações que resultaram em importantes avanços.


A fiscalização efetiva é fundamental para garantir o cumprimento das leis e a punição dos responsáveis. No entanto, a realidade mostra que ainda há desafios a serem superados nesse sentido: a extensão territorial do Brasil e a diversidade de atividades econômicas dificultam a fiscalização em todo o país. Além disso, a falta de recursos adequados e a resistência de grupos poderosos são obstáculos adicionais enfrentados pelos órgãos fiscalizadores, como o Ministério do Trabalho. É necessário investir em equipamentos, treinamento e fortalecimento das equipes para que possam atuar de forma eficaz no combate ao trabalho escravo.


A conscientização da sociedade também desempenha um papel crucial nesse contexto. É importante educar a população sobre os direitos humanos e a gravidade do trabalho escravo, além de incentivar a denúncia de casos suspeitos. A mídia e as organizações não governamentais têm um papel relevante na amplificação dessas informações e na mobilização da sociedade.


Nesse sentido, parcerias entre o setor público e a sociedade civil têm se mostrado essenciais. O engajamento de ONGs, sindicatos e movimentos sociais fortalece as ações de fiscalização, denúncia e assistência às vítimas. Além disso, a adoção de tecnologias avançadas, como o uso de geolocalização e monitoramento remoto, pode otimizar o trabalho dos agentes públicos, possibilitando uma resposta mais rápida e eficaz neste combate.


O trabalho escravo é uma realidade que ainda persiste no Brasil, mesmo diante dos avanços legais e sociais conquistados. Os projetos de lei em andamento demonstram um compromisso renovado em fortalecer a legislação e combater essa prática desumana. No entanto, é fundamental que essas iniciativas sejam votadas e aprovadas, além de serem acompanhadas por uma fiscalização eficiente, capaz de identificar, punir e prevenir o trabalho escravo em todas as suas formas. Somente com um esforço conjunto e uma postura vigilante poderemos avançar rumo à erradicação definitiva do trabalho escravo em nosso país.


*Priscilla Carbone e Renan Duarte são, respectivamente, sócia e membro da Un Trabalhista do Madrona Fialho Advogados

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