Por Dâmares Vaz
Edição: Andrea Bochi
Foi preso nesta quinta-feira, 14 de setembro, em Brasília, o fazendeiro José Alberto de Castro, condenado como intermediário da Chacina de Unaí. Ele foi o responsável por contratar os pistoleiros que executaram os Auditores-Fiscais do Trabalho Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira, em 28 de janeiro de 2004.
Castro, os mandantes Antério Mânica e Norberto Mânica, e o outro intermediário, Hugo Alves Pimenta, mesmo sentenciados pelo Tribunal do Júri, cuja condenação foi confirmada depois por tribunais superiores, vinham respondendo ao processo em liberdade, quase 20 anos depois do crime. Somente os executores haviam sido presos – alguns ainda cumprem pena.
Mas no dia 12 de setembro de 2023, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decretou a prisão de Norberto, Castro e Pimenta, em razão de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que cassou sentença anterior dessa mesma turma do STJ, que permitiu aos réus responder o processo em liberdade. A decisão foi tomada na Reclamação (RCL) 59594, proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Motivada por pedido do Ministério Público Federal (MPF), também a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), com sede em Belo Horizonte, determinou a execução provisória imediata das penas dos irmãos Antério e Norberto. Os mandados foram expedidos nos dias 12 e 13.
A Polícia Federal ainda procura os outros três. De acordo com o jornal Hoje em Dia, a defesa de Antério Mânica declarou que o assassino irá se entregar à Polícia Federal (PF).
Imbróglio judicial
Os mandantes e intermediários da Chacina de Unaí foram condenados em 2015 pelo Tribunal do Júri de Belo Horizonte, quase dez anos depois de terem sido apontados pela Polícia Federal e pelo MPF como responsáveis pelo crime. Entretanto, apesar das penas individuais chegarem perto de cem anos, eles recorreram em liberdade, em razão de serem réus primários.
No julgamento dos recursos, realizado em 19 de novembro de 2018, a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que deveria ser realizado um novo julgamento de Antério. Esse novo julgamento ocorreu no período de 24 a 27 de maio de 2022, na 9ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, e resultou em nova condenação de Antério, por júri popular, a 64 anos de reclusão, bem inferior à primeira pena. Embora a jurisprudência apoiasse a imediata prisão, ele continuava a recorrer em liberdade.
Em relação aos recursos dos outros réus, os desembargadores da Quarta Turma do TRF1 votaram pela redução das penas de Norberto Mânica – que confessou ser o único mandante do assassinato de Nelson José –, de Hugo Alves Pimenta e de José Alberto de Castro. Eles continuaram a recorrer em liberdade e obtiveram do STJ, em setembro de 2022, nova redução das penas.
No STJ, provocada por recurso do Ministério Público Federal que pedia a prisão de Norberto, Pimenta e Castro, a Quinta Turma afastou a incidência de dois dispositivos do Código de Processo Penal (CPP) e negou o pedido do Parquet. O artigo 492, inciso I, alínea “e”, prevê que, no caso de condenação pelo Tribunal do Júri a pena igual ou superior a 15 anos de reclusão, será determinada a execução provisória das penas. No parágrafo 4º do mesmo artigo, a apelação contra condenação pelo Tribunal do Júri a essas penas não terá efeito suspensivo. Com o pronunciamento do STF, o STJ finalmente aplicou o artigo 492 do CPP.
Em relação a Antério Mânica, seus recursos correm no TRF6. Classificando a Chacina de Unaí como “um dos casos mais notórios e terríveis da história de Minas”, a Primeira Turma do TRF6 frisou em sua decisão que a prisão dos Mânica “faz valer a Constituição, nos termos como interpretada pelo Supremo Tribunal Federal”. Na conclusão, afirmou: “a manutenção da liberdade dos réus condenados pelo veredito soberano do júri, ainda neste momento processual, exorbita dos limites da lei processual vigente e da interpretação do Supremo Tribunal Federal”.