A reportagem relata que o resgate de 24 trabalhadores em fazendas de Nova Resende, Juruaia e Areado, no Sul de Minas Gerais levou o deputado a pedir apoio do seu partido e da bancada ruralista para mudar a norma que orienta a fiscalização trabalhista no campo
A reportagem ‘Escravizados do café: Resgates de trabalhadores em MG têm ataques e ameaças’, do jornalista Leonardo Sakamoto, colunista do UOL, publicada no sábado, 29 de junho, relata como o resgate de 24 trabalhadores de condições análogas às de escravo em três fazendas de café, no Sul de Minas Gerais no mês de junho, motivou o deputado federal Emidinho Madeira (PL-MG) a ir à tribuna da Câmara atacar a fiscalização e pedir apoio do seu partido e da bancada ruralista para mudar a norma que orienta a fiscalização trabalhista no campo.
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego apontam que, em 2023, a atividade de onde mais trabalhadores foram resgatados foi o cultivo de café, com 300 pessoas.
Em seu pronunciamento, o parlamentar acusou a fiscalização de causar pânico e criticou o fato de os policiais e servidores públicos envolvidos no combate à escravidão portarem armas pesadas e permanecerem um longo período em cada propriedade. Ele é coordenador da Frente Parlamentar do Café.
Propôs que, ao invés das operações de resgate, houvesse "orientação" e "diálogo" com produtores.
A "dupla visita", quando a fiscalização primeiro orienta e só em outra data pune no caso de manutenção da irregularidade é antiga demanda de alguns setores econômicos. Ela já é prevista pela legislação em casos de infrações leves, mas segue barrada para o crime de escravidão e trabalho infantil.
No dia seguinte, em uma reunião da Comissão da Agricultura e Pecuária, ele repetiu o discurso diante do ministro da Agricultura Carlos Fávaro, que prometeu visitar a região para isso ser “pacificado”.
A equipe de fiscalização disse à coluna que a situação encontrada nas três fiscalizações foi "bem assustadora".
"Em todos os casos encontramos evidências de tráfico de pessoas, intermediado por gatos [contratadores de mão de obra a serviço do fazendeiro], com promessas enganosas e trabalhadores viajando sem saber o valor a ser pago. Também encontramos inexistência de registros, alojamentos degradantes, falta de água potável, de instalações sanitárias e de equipamentos de proteção, além de casos em que os trabalhadores tinham que comprar as próprias ferramentas", afirmaram Auditores-Fiscais.
A reportagem também destaca que as declarações do deputado no dia 18 de junho levaram a uma série de notas de repúdio, bem como de apoio ao combate à escravidão contemporânea, por parte de organizações da sociedade civil. Uma delas é do SINAIT.
O jornalista relata que o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho afirmou que "a presença de autoridades policiais nas operações é uma medida de segurança, não um ato de intimidação aos produtores".
"Tal medida é necessária porque os casos de agressões, ameaças, intimidações, e até assassinatos, infelizmente são constantes." O sindicato lembra que a Chacina de Unaí, em que quatro funcionários do Ministério do Trabalho foram executados a mando de proprietários rurais, ocorreu em Minas.
O pai do deputado, o produtor rural Emídio Alves Madeira, já esteve relacionado no cadastro de empregadores responsabilizados por trabalho escravo, a chamada “lista suja” pelo menos duas vezes: em outubro de 2017, por causa de um resgate de 14 pessoas em Bom Jesus da Penha (MG) ocorrido em 2016; e em março de 2017, por outra operação que envolveu 60 trabalhadores no mesmo município, mas em outra fazenda, em 2015. Madeira faleceu em 2021 por complicações da covid-19.
Mais ataques
Em 6 de junho, uma operação da Polícia Federal teve como alvo um homem que disparou áudios com ameaças contra a fiscalização do trabalho que atua na região cafeeira de Minas Gerais. Ele prestou depoimento e teve o celular apreendido.
O superintendente Regional do Trabalho, Carlos Calazans, afirmou à coluna que a PF está investigando se o homem estava agindo a mando de alguém, se estava articulado com outras pessoas e se é “gato”, como são chamados os contratadores de mão de obra a serviço de fazendeiros. Os áudios chegaram aos servidores públicos durante fiscalização em lavouras na região do município de Muzambinho.
Confira aqui a íntegra da matéria do UOL.