Debate na Assembleia Legislativa de Minas Gerais aborda trabalho escravo e ameaças a Auditores-Fiscais

SINAIT foi representado pela delegada sindical da entidade em Minas Gerais Ivone Corgosinho Baumecker


03/07/2024



A delegada do SINAIT em Minas Gerais Ivone Corgosinho Baumecker representou o Sindicato Nacional na audiência pública realizada nesta quarta-feira, 3 de julho, na Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social, da Assembleia Legislativa de Minas, que debateu o trabalho escravo e a ameaça e perseguição a Auditores-Fiscais do Trabalho no efetivo exercício de suas funções em regiões no Sul do estado. 

A audiência requerida pelos deputados estaduais do PT Leleco Pimentel e Betão ocorre em função de ataque e ameaça à fiscalização que resgatou 24 trabalhadores nas lavouras de café da região, em junho passado. Os ataques foram proferidos pelo  deputado Emidinho Madeira (PL/MG) e a ameaça por um homem, via mensagem no WhatsApp, que está sendo investigado pela Polícia Federal.

A representante do SINAIT disse que não ia tratar de números do trabalho escravo em sua participação na audiência, porque se houver um caso já é demais. Disse que a ideia de exploração em níveis desumanos amarra o avanço da sociedade brasileira. Segundo ela, isso impede a existência de uma sociedade igualitária e fraterna, onde as pessoas possam buscar conforto e serem felizes. 

“Essas ideias malvadas que permeiam o mundo do trabalho, de que é possível trabalhar de qualquer jeito, dormir de qualquer jeito está em tudo. No Uber, nas pessoas que levam comida para nós, está na Gig economy, no trabalho doméstico e permeia a sociedade”, atestou a Auditora-Fiscal.

Disse que a escravidão só é possível por conta das diferenças, porque ninguém escraviza os iguais. Da diferença social que cria o preconceito, que resulta na aporofobia, o preconceito contra as pessoas pobres/simples, e que divide a sociedade em castas. 

“Penso que deveríamos ter uma sociedade em que o conforto deveria ser uma obrigação. Uma sociedade feliz não mata e não escraviza pessoas, não mata mulheres, tem crianças felizes e saudáveis em ótimas escolas, tem um meio ambiente que não queima. E a nossa luta como Auditores-Fiscais é incansável, vale não somente para o mundo do trabalho, mas para que a gente tenha uma sociedade mais justa”, declarou a representante sindical.

Cargosinho dividiu o seu tempo de fala com colega Auditor-Fiscal do Trabalho Rogério Reis, que fez um relato da situação encontrada nas fazendas de café nesta ação fiscal em questão. 

De acordo com Rogério, das sete fiscalizações realizadas, eles encontraram trabalho escravo em três. Em todas essas ocasiões, a sonegação era total e todos os trabalhadores estavam sem registro em carteira. Segundo ele, o trabalho sem registro não ocorre porque o trabalhador deseja, mas sim por imposição dos empregadores. Também destacou a presença de adolescentes descalços em atividade e refutou a ideia de que a fiscalização exige demais dos empregadores.

Rogério mencionou ainda que um terço do trabalho escravo em Minas Gerais está relacionado à colheita de café e que a Polícia Federal os acompanha nas operações para garantir a segurança necessária para realizarem seu trabalho com tranquilidade.

Destacou ainda que os Auditores-Ficais do Trabalho fazem a caracterização do trabalho escravo baseado em técnicas e instrumentos do Ministério do Trabalho que regulamentam a atividade. “Estamos sempre preocupados em prestar o melhor trabalho para a sociedade e esse trabalho [de combate ao trabalho escravo] é essencial para humanizar e proporcionar condições dignas aos trabalhadores.” 

Livro

No fim de sua fala, Corgosinho entregou um exemplar do livro “Resgates – Combate ao Trabalho Escravo Contemporâneo no Brasil”, com fotos e relatos de inúmeras ações fiscais realizadas ao longo dos 26 anos do Grupo Especial de Fiscalização Móvel no Brasil. O exemplar passará a fazer parte do acervo da biblioteca da Assembleia Legislativa.

Prevenção

Antes de Ivone Corgosinho, o superintendente Regional do Trabalho de Minas Gerais, Carlos Alberto Menezes Calazans, fez sua participação na audiência. Disse que em janeiro visitou produtores rurais de café do Sul de Minas Gerais em Alfenas, Conceição de Aparecida, Muzambinho, Nova Resende entre outras localidades, fazendo um trabalho preventivo.

“Conversei com os produtores, falei para eles cuidarem das pessoas, darem comida e trabalho decentes. O que custa dar comida, água e trabalho decentes ao trabalhador?”, questionou o superintendente.

Disse que “levar dignidade, o trabalho decente e seguro para o campo, aos lugares remotos é uma tarefa da sociedade. Não pode a Fiscalização do Trabalho do Ministério do Trabalho ter essa responsabilidade sozinha”, atestou.

Também lembrou/alertou que a Chacina de Unaí resultou de ameaças como esta recebida recentemente no Sul de Minas.

Informou ainda que a Superintendência Regional do Trabalho de Minas Gerais (SRT/MG) está providenciando um encontro com todas as certificadoras de café em Minas Gerais, uma vez que a fiscalização flagrou violações trabalhistas em fazendas de café do estado que possuem ou possuíram até recentemente o selo C.A.F.E. Practices, sigla para Coffee and Farmer Equity, o programa de certificação que avalia fornecedores em mais de 200 indicadores ligados à transparência, qualidade, responsabilidade social e ambiental.

Denúncia

Calazans denunciou um decreto grave publicado pelo governo do estado de Minas Gerais, em 7 de maio de 2024, que retirou o direito de voto de todos os integrantes do Comitrate – (Comitê Estadual de Atenção ao Migrante, Refugiado e Apátrida, ao Enfrentamento do Tráfico de Pessoas e à Erradicação do Trabalho Escravo de Minas Gerais), instituído pelo Decreto Estadual nº 46.849, de 29 de setembro de 2015. Apenas as entidades do governo ficaram com o direito ao voto.

Disse que se o governo do estado não refizer esse decreto nos próximos dias, os demais integrantes do Comitê, a exemplo da SRT/MG, vão convocar a instalação de um comitê alternativo com direito a voz e voto, para que todos abracem esta causa”, informou.

Ao fim de sua fala pediu uma salva de palmas à Fiscalização do MTE que com seu trabalho resgata a cidadania do povo brasileiro.

 Encaminhamentos 

Entre os encaminhamentos finais da audiência estão um requerimento de repúdio ao deputado Emidinho Madeira e envio de documento à Coffee and Farmer Equity.


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