32% de todas as contratações de pessoas com deficiência realizadas no Brasil nos últimos anos ocorreram após a notificação do empregador por um Auditor-Fiscal do Trabalho
Por Lourdes Marinho
Edição: Nilza Murari
Criada para garantir a inclusão, a Lei 8.213/91, conhecida como Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência, completa 29 anos neste dia 24 de julho. A lei determina a contratação de um percentual de pessoas com deficiências e reabilitados da Previdência Social nas empresas de acordo com o número de 100 ou mais funcionários. Apesar dos avanços, a Lei ainda não é cumprida por grande parte dos empregadores e há muito a se fazer para que de fato consiga incluir este segmento no mundo do trabalho.
Dados do Ministério da Economia mostram que setores como a educação, indústrias de transformação, comércio e serviços de transportes e armazenagem, são os que mais preenchem estas vagas para pessoas com deficiências. Os setores que menos empregam são as empresas de atividades de vigilância, mão de obra temporária e de teleatendimento.
Em 2018 os Auditores-Fiscais do Trabalho fizeram 11.401 fiscalizações da cota de PcDs e reabilitados e lavraram 4.668 autos de infração, sendo 3.289 pelo não preenchimento da cota e 1.386 pela rescisão de PcDs sem substituição. Com as ações fiscais, conseguiram incluir aproximadamente 50 mil pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
De acordo com os Auditores-Fiscais do Trabalho, os desafios para fazer as empresas brasileiras cumprirem a lei são ainda maiores neste período de pandemia do novo coronavírus. O quadro agravou a crise econômica do país e contribuiu para aumentar as taxas de desemprego, principalmente por conta do fechamento de empresas, em especial nos setores de comércio e serviços.
Sensibilização
É neste cenário desafiador que a Auditoria- Fiscal do Trabalho atua, para garantir a inclusão desses trabalhadores no mercado de trabalho.
Em uma entrevista à Central Única dos Trabalhadores – CUT a Auditora-Fiscal do Trabalho e coordenadora do Projeto de Inclusão de Pessoas com Deficiência no Mercado de Trabalho na Superintendência Regional do Trabalho de Minas Gerais, Patrícia Siqueira Silveira, disse que o trabalho da fiscalização nesta área envolve muito mais a sensibilização, o convencimento e as negociações. “A gente trabalha para articular com entidades parceiras, com o INSS, a sociedade civil e órgãos governamentais para que possamos elaborar projetos que ajudem o cumprimento da legislação. A gente só multa quando a empresa não tem nenhuma disponibilidade para questão do cumprimento da Lei”, explica.
Segundo ela, muitas vezes a Auditoria-Fiscal faz termos de compromisso com as empresas, envolvendo cláusulas de acessibilidade e projeto de requalificação profissional pra que essas pessoas sejam contratadas. Só em 2018, foram feitos quase 700 termos. “32% de todas as contratações de pessoas com deficiência realizadas no Brasil nos últimos anos ocorreram após a notificação do empregador por um Auditor-Fiscal do Trabalho”, afirmou Patrícia. Veja a matéria aqui.
Há um enfrentamento diário com os empregadores que, na maioria das vezes, de início, buscam argumentos para justificar a impossibilidade de contratação de pessoas com deficiência. Seja por desconhecimento ou por preconceito, a situação exige da Inspeção do Trabalho um constante aprimoramento e articulação com os órgãos governamentais, com a sociedade civil organizada e com as associações para a defesa dos direitos das pessoas com deficiência.
Neste período de pandemia isso tem sido reforçado. De acordo com Patrícia, a fiscalização neste momento de pandemia está totalmente direcionada para a manutenção dos postos de trabalho, as demissões e desligamentos irregulares de pessoas com deficiência e estrutura e segurança de trabalho. “A nossa fiscalização não quer só ver a questão da contratação, mas também a questão de acessibilidade, desenvolvimento no mercado de trabalho e até a questão da acessibilidade de comunicação nos protocolos de segurança”, informa.
Além das fiscalizações, os Auditores-Fiscais do Trabalho têm utilizado também o recurso das lives para falar com esses e demais trabalhadores e com a sociedade em geral. Também por meio de canais de comunicação remoto têm orientado trabalhadores e empregadores. Para as empresas, o principal é que entendam que precisam adaptar sua organização, adequar sua estrutura física e sua comunicação para receber pessoas com deficiência.
Lei de cotas
O presidente do SINAIT, Carlos Silva, manifestou a indignação dos representantes da entidade com a proposta de Medida Provisória do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – MDH – relembre aqui. “A minuta repagina com outra aparência o que já está posto no Projeto de Lei 6159/2019, que reduz abruptamente o número mínimo de pessoas com deficiência contratadas por empresas”.
Para ele, esta é uma clara falta de sensibilidade e de avaliação do que está sendo proposto e que o MDH, proponente da matéria, desconsiderou, inclusive, os impactos financeiros dessa alteração no momento posterior à sua implantação. “Nossa avaliação é de que a medida traz prejuízos a todos. Aqueles que não conseguirem colocação no mercado de trabalho, certamente, irão demandar à Previdência Social o benefício de Prestação Continuada”, refletiu. E continua: “Vamos trabalhar para que o texto seja revisto e as pessoas com deficiência tenham seus direitos garantidos, para que cessem as tentativas de reduzir a proteção legal conquistada com muita luta”, enfatizou.
Na opinião do dirigente sindical, é preciso buscar novos caminhos para garantir a qualificação dessas pessoas, inclusive, aqueles oriundos do sistema de acolhimento institucional. “Isso precisa ser feito de maneira harmônica e não sem consulta à sociedade. São medidas que não podem se chocar, mas convergir”, ponderou.
Iniciativas como a proibição de demissão de trabalhadores e trabalhadoras com deficiência sem justa causa, assegurada pela Lei 14020/2020 aprovada no último dia 7 de julho no Congresso Nacional, a nota Técnica do Ministério Público do Trabalho (MPT) em parceria com a Procuradoria Geral do Trabalho (PGT) que recomenda que as empresas não façam suspensão do contrato de trabalho desta população na pandemia e a recomendação do Conselho Nacional de Saúde para que o sistema de saúde garanta a prioridade no atendimento das pessoas com deficiência são algumas das vitórias mais recentes desses trabalhadores neste momento tão vulnerável.